"Onde reinam intenções honestas,
mal entendidos podem ser curados
com rapidez e eficácia."

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8 de julho de 2012

Duelos Verbais

Duelos verbais foi o título que Martha Medeiros deu à crônica escrita por ela e publicada no jornal Zero Hora do dia 24 de junho de 2012. Após assistir ao filme "Deus da Carnificina", a cronista assim descreve e comenta sobre o que viu e sentiu:


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     "A história: dois garotos de 11 anos brigam por bobagem num parque, e um deles acaba atingindo o outro fisicamente. O filme mostra, do início ao fim, a visita que os pais do agressor fazem aos pais do menino agredido. Tudo muito cordial e civilizado, até que as máscaras da hipocrisia vão caindo uma a uma, e o barraco se instala. E que barraco, senhoras e senhores.
     Dois casais que não se conhecem, fechados num apartamento. Uma chatonilda politicamente correta, um viciado em trabalho que não desgruda do celular, uma mulher controlada que muda de personalidade após dois goles de uísque e um desencanado que gostaria de estar em qualquer outro lugar, menos ali - com qual deles você se identifica? Um pouco com todos, não há escapatória.
     Assim que o filme termina, fica evidente: como somos patéticos, tanto na civilidade quanto na baixaria, tanto sóbrios quanto alcoolizados. E contraditórios: julgamos mal uma pessoa por causa de uma única frase, e dali a minutos voltamos a simpatizar com ela por ter concordado com algo que dissemos. Fazemos um dramalhão por pequenas coisas, expomos carências infantis, perdemos a compostura, fazemos confissões íntimas a estranhos - que meleca.
     Lá pelas tantas um deles se pergunta: por que as coisas não podem ser mais simples: Ah, é tudo que se quer. Foco, objetividade, ir direto ao ponto. Mas quem consegue? À medida que o filme avança, a situação torna-se tão sem controle que a plateia começa a rir, e é essa reação que deveríamos ter dentro da nossa própria sala, não só na sala do cinema. Rir do nosso delírio de levar a ferro e fogo situações banais, da nossa insistência em querer causar uma boa impressão, de nos comportarmos como se estivéssemos num tribunal. Qual o propósito de tamanho desgaste, se as coisas solucionam-se quase sempre por si mesmas?
     Na saída do filme acompanhei sem querer a conversa de um casal: ela havia amado o filme, o marido havia odiado. E instalou-se a discussão pelos corredores do shopping. Ela tentando convencê-lo da genialidade das cenas, ele se permitindo achar tudo uma aporrinhação. Ela frustrada com a falta de concordância dele, ele cansado da ladainha dela, sem reparar que estavam, ambos, dando continuidade ao roteiro.
     Patéticos, nós todos. Cada um defendendo suas razões como se disso dependesse a nossa sobrevivência. Ninguém se conforma com sua solidão interna."